Thursday, June 28, 2007

À Mesa do Mundo VI – Luís Suspiro na Quinta de Santo António

Conheci a arte de Luís Suspiro na Ereira, no velho Condestável, numa refeição extraordinária e enriquecida por conversas gastronómicas em torno dos boletus e dos salmonetes de Setúbal. Ainda não visitei a sua mais recente casa, Na Ordem..., mas tive o prazer de reencontrar a arte do mestre Suspiro há poucos dias, num casamento. O N., homem de bom gosto, foi amigo dos seus amigos, e contratou um dos melhores cozinheiros portugueses para animar a boda que se realizou na quinta da família, perto do Cartaxo. Ficar-lhe-emos eternamente gratos, pois a experiência roçou, em alguns momentos, o sublime, e Suspiro acabou por ser a estrela do casamento (a noiva que me perdoe). E não estou a fazer uma avaliação dentro dos baixos padrões da “comida de casamento”.


Durante um par de horas, e antes de nos sentarmos à mesa, fomos brindados com uma longa viagem pela gastronomia portuguesa, feita de engenho, criatividade e primor técnico. Como devem calcular, não tirei notas, para além do registo visual. Mas tão cedo não me vou esquecer de alguns sabores que me passaram pela boca, tal como a açorda de ovas, a açorda de tomate, o bacalhau à brás, a feijoada e o creme de abóbora. Os enchidos eram perfeitos (a morcela com compota de ameixa que se vê ali em baixo numas colheres brancas é indescritível) e estavam muito bem acompanhadas pelo pão confeccionado pelo próprio Luís Suspiro. Circularam também diversas chamuças e empadinhas, todas elas surpreendentes e deliciosas. E aquele crepe que se vê numa das imagens, por cima do creme de abóbora, quase nos levava às lágrimas.
















À mesa a festa foi mais modesta e o chefe arriscou menos. Compreende-se, é necessário servir centena e meia de convidados, e não há milagres. E é preciso agradar a todos. Mesmo assim, a refeição deixou bem lá em baixo os tais padrões da “comida de casamento”. Começámos com uma Perdiz de Escabeche com Misto de Salada alface Frisada e Frutos Secos, muito boa. Depois, veio o melhor, os Lombos de Bacalhau com Batatinhas a Murro em Versão Lagareira, Miga Crocante de Espinafres com Broa de Milho, Frutos Secos e Molho de Queijo de Serpa. Foi, provavelmente, o melhor bacalhau que comi em Portugal. (O seu sabor, textura e a forma como se abria em lascas deu a ideia de que poderia ter sido confitado, mas não posso garantir que tenha sido esse o tratamento.) Para limpar o palato tivemos um Sorvete de Maçã Verde com Molho de Poejo e Maracujá Roxo.
As Bochechas de Porco Preto de Barrancos em Vinho Tinto Acompanhadas por Castanhas com Erva Doce e Espargos Verdes Salteados em Azeite Virgem de Ervas, resultaram muito bem, com a carne a desfazer-se ao contacto com garfo. Só as castanhas acusaram as características do jantar, tendo chegado à mesa um pouco secas. No entanto, o sabor dado pela erva doce é digno de registo. Para sobremesa, Suspiro ofereceu-nos Frutos Silvestres com Pastelinho de Tentúgal em Dois Dhocolates e Sorvete de Manga. Os frutos silvestres estavam demasiadamente gelados, a fazer doer os dentes, o que retirou algum do prazer que o prato nos poderia ter dado, mesmo depois de várias horas a experimentar sabores. Mas a avaliação geral do jantar é elevada. Já em relação às entradas, a nota máxima é a mais justa. O Luís continua em forma.

Carlos Miguel Fernandes

1 comment:

Cláudia A. said...

Que banquete magnífico. Fiquei encantada e com água na boca.