Monday, August 22, 2005

Ajvar

É fácil. Assam-se três pimentos (prefiro vermelhos) e uma beringela. Retiram-se a pele e as sementes, e tritura-se tudo com um dente de alho, sal e pimenta. Juntam-se umas gotas de limão ou um pouco de vinagre, e tanto azeite quanto os vegetais consigam absorver. Na Sérvia, de onde esta receita vem, o azeite não abunda, e usar-se-ão, com certeza, outros óleos. Mas, se o temos, usemo-lo.
Serve-se frio. No receituário sérvio aparece na secção das saladas, logo, como manda a tradição local, antecede o prato principal. Nas refeições balcânicas a salada é omnipresente, e esse facto deveria ser uma lição para os habitantes deste país de (esquecidas) tradições mediterrânicas.
Mas, para além do carácter “entradeiro”, o ajvar pode ter outras funções. Uma, que não lhe fica nada mal, consiste em servir de molho para mergulhar os, também sérvios, cevapcici. O que são? Fica para a próxima!


Carlos Miguel Fernandes

Tuesday, August 16, 2005

Dois molhos para o Verão

O Tzatziki vem da Grécia e os seus sabores e aromas mediterrânicos são facilmente reconhecidos por quem aprecia a gastronomia dos povos banhados pelo mar cálido. É feito de iogurte natural previamente coado (para quatro pessoas, quatrocentos gramas é suficiente), ao qual se juntam três colheres de sopa de pepino picado, sem sementes, e duas ou três cabeças de alho (muito bem) picadas. Tempera-se com sal e pimenta preta moída na altura, adiciona-se um fio de azeite e algumas gotas de sumo de limão. Está pronto para ser servido depois de estagiar no frigorífico até alcançar a frescura desejada. Come-se com bolachas, tostas ou pão pita. Como acontece com a maior parte das receitas tradicionais, existem inúmeras variantes e as quantidades podem ser adaptadas ao gosto dos que se sentam à mesa.
O Guacamole é de origem mexicana e sustenta o seu sabor exótico no abacate. Este, após ter sido aliviado da casca e da pele, deve ser esmagado até apresentar uma consistência pastosa. Para quatro pessoas pode-se começar com dois abacates. Depois, juntam-se dois tomates pequenos e maduros bem triturados e uma cebola picada. Deita-se uma macheia de coentros picados e mexe-se até os ingredientes mostrarem uma distribuição uniforme. Junta-se tabasco, com ou sem moderação, e um pouco de sumo de lima. Serve-se com totopos, cumprindo a tradição. Os nachos não fazem parte do receituário mexicano, são uma invenção norte-americana. Mas também servem.


Carlos Miguel Fernandes

Thursday, August 11, 2005

O Gaspacho
(texto escrito para o blogue No Mundo no dia 2 de junho de 2005)
Nos últimos dias tenho tropeçado num pequeno filme publicitário que pretende mostrar as virtudes de mais um produto de uma conhecida empresa multinacional que se movimenta no ramo da alimentação. O alvo, desta vez, é a cozinha mediterrânica. Sabendo que esta não vive sem diversidade, produtos frescos e espaços abertos, não é possível reagir a tal desrespeito pela inteligência do consumidor sem um sorriso de escárnio. Um produto industrial, consumido em espaços fechados e assépticos, como representante da cozinha mediterrânica!? Patético. Mas, enfim, deixemos mais este disparate e concentremo-nos na verdadeira gastronomia do sul europeu. Troquemos a proposta ignara e aproveitemos os dias de calor para apreciar o ilustre gaspacho andaluz.
O gaspacho não é prato estranho à gastronomia portuguesa. Encontra-se no Alentejo e no Algarve com os legumes toscamente cortados - na maior parte dos casos - ou triturados, num estilo que está mais associado ao sul de Espanha. Nenhuma das versões se pode vangloriar de ter o sabor mais sedutor. Ambas se recomendam. Escolhi a receita andaluza para homenagear a cozinha da região, que é, sem dúvida, uma das melhores do mundo, embora seja, incompreensivelmente, pouco conhecida em Portugal (nem vale a pena falar das manifestações habituais de repúdio pela gastronomia espanhola; estas, apenas revelam uma qualquer espécie de demência crónica).
Junta-se, num recipiente largo e alto, um quilo de tomate, um pimento verde, meio pepino, uma cebola, três ou quatro cabeças de alho, uma fatia de pão, uma chávena de azeite, meia chávena de vinagre, uma colher de chá de colorau, uma colher de sopa de orégãos, sal, pimenta e cominhos (aconselho cominhos negros, uma variante mais suave da semente, a qual descobri recentemente num mercado turco de Berlim). Os mais obcecados com a forma da cintura podem ignorar o pão, pois tal variante não resulta menos atractiva. Tritura-se tudo até se obter uma pasta uniforme, sem medo de recorrer a auxiliares eléctricos para a tarefa. Junta-se cerca de um litro de água e mexe-se (a quantidade de água apenas afecta a cremosidade do gaspacho; pode-se, por isso, colocar mais ou menos, consoante o resultado pretendido). Coloca-se no frigorífico durante algumas horas. Serve-se frio, com cubos de gelo.
Este prato sujeita-se bem a variações nas quantidades, e até aceita sem reservas a introdução de novos ingredientes. No livro do qual foi retirada a base desta proposta, podem ver-se oito receitas diferentes de gaspacho, onde entram, para além dos ingredientes mencionados em cima, ovos, amêndoas, e até beterraba.
O gaspacho é um ícone da gastronomia mediterrânica. É uma fonte de prazer e frescura nestes dias quentes que prenunciam o verão. É saboroso, é saudável e é barato. Foram estas características que lhe permitiram evoluir e sobreviver numa região pobre, cujos habitantes sempre aproveitaram, de uma forma criativa, aquilo que a terra lhes dá.

Carlos Miguel Fernandes