Monday, September 15, 2008

À Mesa do Mundo – Semproniana (Barcelona)

A carrer Roselló, uma das muitas vias extensas que compõem os Eixamples, é, na zona que se aproxima da Faculdade de Medicina, um segredo bem escondido e afastado do fluxo turístico. É lá que se encontra o Semproniana, um restaurante que já havia visitado em 2006, e ao qual voltei há pouco dias para confirmar a avaliação prévia. As molejas saíram, com muita pena nossa, do menu, mas o brazo de un gitano moreno, imagem de marca da casa, lá estava para nos estimular com a sua personalidade forte. Um canelone, um recheio de botifarra negra e um molho de parmesão, e o resultado é uma ode a uma certa gastronomia mediterrânica, um delírio de sabores em confronto, uma simplicidade desarmante. A refeição seguiu com o tamboril com judias e açafrão, e dois pratos fortes, um coelho recheado de verduras, e um pregado, que, como se sabe, é das melhores coisas que anda pelos oceanos. O Celia 2001, um reserva da Ribera del Duero, teve que se aguentar com tamanha diversidade, mas um grande vinho porta-se sempre bem (e este era “enorme”) e uma refeição nunca se pode desviar do que lhe é central: a comida, e esta estava irrepreensível. O Semproniana, mais uma vez, rondou a perfeição. Em Espanha só me sento para uma refeição tradicional quando a proposta é muito estimulante. A tapa está-me no sangue, e não é de ânimo leve que troco os longos roteiros feitos de marisco, frituras, enchidos e muitos outros petiscos saídos do riquíssimo receituário espanhol, pela tranquilidade de um jantar “de faca e garfo”. O Semproniana consegue tirar-me da barra e sentar-me à mesa. Mas antes não dispenso um par de cañas e umas setas no bar do 150 da Roselló, mesmo ao lado do restaurante, e que se pode ver na imagem aqui em baixo. Um excelente ponto de encontro. E um daqueles lugares em que, por vezes, nos sentimos no centro do mundo.


Carlos M. Fernandes, Barcelona, 2008

Carlos Miguel Fernandes

Tuesday, September 02, 2008

Espetada de Fígados de Galinha

Com um quilo de fígados de galinha a descongelar, oscilei entre a Hungria e a Sérvia. Iria guisá-los sobre um refogado de azeite, cebola, alho e tomate, com muita paprika, como se come em Budapeste, ou furá-los com um espeto e grelhá-los, celebrando o petisco das cervejarias de Belgrado? Decidi dividir o lote em duas porções e arrancar para um labor duplo. Quem quiser fazê-las ao estilo húngaro, basta seguir esta receita de moelas pato, mas sem o vinho. As espetadas são ainda mais simples. Sal, pimenta, e grelha. A estas, que se podem ver na imagem, acrescentei-lhe gomos de tomate, e acompanhei com um creme de batata (batata cozida e triturada com água da cozedura, azeite e salsa), cebola confitada e redução de sumo de laranja. Os fígados podiam ser de pato (normais, sem a engorda do foie gras, mas muito saborosos), e o creme podia ser de batata-doce. A imaginação cria sempre pratos mais sugestivos, mas esta foi uma refeição improvisada, e usou-se o que havia na cozinha.

Carlos Miguel Fernandes