Para já fica só o "boneco", mas em breve falarei desta minha abordagem a mais um prato clássico da cozinha algarvia.
Carlos Miguel Fernandes
Una olla de algo más vaca que carnero, salpicón las más noches, duelos y quebrantos los sábados, lantejas los viernes, algún palomino de añadidura los domingos, consumían las tres partes de su hacienda.
Carlos Miguel Fernandes, Belgrado, 2003
Carlos Miguel Fernandes
As amêijoas vieram da ria de Alvor e brilho não lhes faltava. Continua a ser em Cacela-Velha que lhes encontro o grau supremo da formosura, pois todos os sentidos comem, mas eram magníficos estes bichos do Barlavento que me quase me alagavam a cozinha com as suas esguichadas. Abri quinze numa panela fechada sem qualquer gordura nem sal. Separei o miolo da concha e reservei o suco que ficou no fundo do tacho (o qual teria sido filtrado, se eu não estivesse em cozinha alheia, sem lhe conhecer os esconderijos). Cortei cinco paralelepípedos de excelente pão algarvio, com seis ou sete centímetros de comprimento, e torrei-os sem endurecer muito; o pão deve ficar crestado por fora e mole por dentro e a consistência do pão do Algarve, o melhor que se faz no país, facilita o processo. Ao lado já havia misturado a água largada pelas amêijoas com um pouco de azeite (uma parte de água para três de azeite). Adicionei ainda dois dentes de alho e um punhado de coentros, tudo muito bem picado. Não tinha almofariz e muito menos uma trituradora eléctrica, mas tentei, com uma colher, misturar os sabores. Barrei o pão com o azeite aromatizado, coloquei três amêijoas sobre cada tira, e reguei tudo com o resto do molho. (Nota: nem uma pitada de sal! O que vem com as amêijoas é mais do que suficiente.)