Uma Refeição (7): Os Vinhos (Sugestões de Fernando Cruz Gabriel)
Prato 3: Foie Gras Frito na Própria Gordura com Compota de Maçã, Presunto de Pato Crocante e Mandioca
Kracher Cuvée Beerenauslese, 2003
Castas dominantes: Chardonnay (80%) e Welschriesling (20%)
Produtor: Kracher (Áustria)
Um Late Harvest, feito a partir de uvas colhidas à mão e carregadas de "podridão nobre" (por isso é um Beerenauslese), que lhe dá uma elevada concentração de açúcar residual. Apesar da "identidade húngara" do prato, este Kracher parece-me preferível à generalidade dos Tokaj, pelo nariz delicado e pelo aveludado no palato. Às vezes encontra-se cá, no Club Gourmet do El Corte Inglés, a um preço surpreendentemente razoável. Necessita de copo adequado e refrigeração apropriada. Tem a vantagem de ser também uma excelente escolha para sobremesa.
Prato 4: Raia em cama de pão catalão, com espetadinha de camarão e caña de lomo ibérico e açorda de ovas de bacalhau
Vindima 7 de Outubro 2003
Casta Dominante: Viognier
Produtor: Quinta do Monte d’Oiro (Portugal).
Contra a boçalidade geral dos Chardonnay, a minha recomendação é um Viognier: um branco com personalidade própria, para variar. A baixa acidez e elevado teor alcoólico (para um branco) permite-lhe acompanhar pratos de peixe de sabor forte e vincado. A Quinta do Monte d’Oiro produziu um excelente Viognier: Vindima 7 de Outubro 2003. Se conseguir encontrar garrafas à venda —parabéns: merece saboreá-las. Quando comprei as primeiras garrafas sugeriram-me que as usasse para acompanhar um borrego assado. Julguei que se tratava de uma brincadeira. Não era.
Prato 5: Pato com risotto dos seus “miúdos” e salada de rucola e agrião com Parmesão
1. Château le Grand Vostock Cuvée Karsov
Casta dominante: Cabernet Sauvignon
Produtor: Château Le Grand Vostock (Rússia)
2. El Nido Clio 2003
Castas dominantes: Monastrell (70%), Cabernet Sauvignon (30%)
Produtor: Bodegas El Nido (Espanha)
3. 2001 Zinfandel - Sonoma County, Monte Rosso Vineyard
Casta dominante: Zinfandel
Produtor: Rocking Horse Vineyards (EUA)
No caso deste prato, a escolha óbvia é um Cabernet Sauvignon, mas um Zinfandel ou até um Pinot Noir são perfeitamente razoáveis. Todos têm características adequadas ao acompanhamento de um prato de pato. Acabei por excluir os Pinot Noir de consideração e fazer três recomendações.
A primeira escolha é talvez a mais inesperada: um Cabernet russo. Na Rússia é costume dizer-se que o melhor vinho nacional é o vodka. Os vinhos a preços mais modestos eram importados da Moldova e da Geórgia — até às sanções económicas decretadas por Putin. Para lá disso, só vinhos ocidentais. A ideia de um vinho russo de elevada qualidade parecia um projecto irrealizável. Até que em 2003 Nikolai Pinchuk, director do Château Le Grand Vostock, decidiu tentar. Com tecnologia francesa, apoio de consultoria do Château Mouton Rothschild e sob a direcção do enólogo Frank Duseigneur, em poucos meses criaram-se as condições para a produção de vinhos de alta qualidade. Devia ser um case study obrigatório, em países como Portugal.
Num jantar em Moscovo experimentei este Château le Grand Vostock Cuvée Karsov. Acompanhou uma entrada de língua de vaca em gelatina de cogumelos com molho amargo de rábanos e um prato principal de costeletas de vitela, com molho de uva e tangerina. É um vinho estruturado, onde se nota bem a madeira. A probabilidade de o encontrar no mercado nacional é próxima do zero, mas como gostaria de o voltar a provar, recomendo-o.
Em alternativa, sugiro um vinho recente e notável: o El Nido Clio 2003. É produzido na zona de Jumilla, no interior do triangulo definido por Murcia, Albacete e Alicante. O Monastrell, uma casta antiga que a filoxera quase exterminou, dá-lhe uma cor mais escura do que o matiz normal dos Cabernets. É um vinho intenso e carregado de taninos. Em comum com o Cuvée Karsov tem um travo picante, apimentado, e um final prolongado. Se não estiver disponível por cá, deve ser fácil de encomendar (das garrafas que trouxe de Bilbau, já só tenho uma).
A vinha de Monte Rosso é uma vinha “histórica” de Sonoma County, CA: data do séc. XIX e tem condições geográficas e climatéricas excepcionais. Adicionalmente, as vinhas de Zinfandel tendem a ser antigas (a casta é muito resistente). Estes dois factos explicam a elevada quantidade e qualidade de vinhos desta casta originários de Sonoma County.
O Zinfandel produzido pela Rocking Horse Vineyards poderá não ser o melhor da região: tenho lido notas de prova extremamente elogiosas a outros vinhos da mesma casta, como por exemplo o Zinfandel produzido em Sonoma County pela Ravenswood. Mas decidi basear as minhas recomendações no que bebi, não no que li. É um vinho carregado de fruta, estruturado (tem 16°), com sabor a noz moscada e um final longo. Espero que o pato não se deixe intimidar.
Por fim, uma recomendação geral: é fundamental escolher os copos apropriados às características dos vinhos. A linha Vinum extreme da Riedel é capaz de satisfazer todas as necessidades. A aquisição de diferentes tipos de copos de vinho não exige uma despesa tão elevada como possa parecer à primeira vista: há sempre castas que são consumidas com maior frequência relativa e o mesmo formato de copo, por regra, adequa-se a diversas castas. Só é preciso saber escolher.
Fernando Cruz Grabriel
Kracher Cuvée Beerenauslese, 2003
Castas dominantes: Chardonnay (80%) e Welschriesling (20%)
Produtor: Kracher (Áustria)
Um Late Harvest, feito a partir de uvas colhidas à mão e carregadas de "podridão nobre" (por isso é um Beerenauslese), que lhe dá uma elevada concentração de açúcar residual. Apesar da "identidade húngara" do prato, este Kracher parece-me preferível à generalidade dos Tokaj, pelo nariz delicado e pelo aveludado no palato. Às vezes encontra-se cá, no Club Gourmet do El Corte Inglés, a um preço surpreendentemente razoável. Necessita de copo adequado e refrigeração apropriada. Tem a vantagem de ser também uma excelente escolha para sobremesa.
Prato 4: Raia em cama de pão catalão, com espetadinha de camarão e caña de lomo ibérico e açorda de ovas de bacalhau
Vindima 7 de Outubro 2003
Casta Dominante: Viognier
Produtor: Quinta do Monte d’Oiro (Portugal).
Contra a boçalidade geral dos Chardonnay, a minha recomendação é um Viognier: um branco com personalidade própria, para variar. A baixa acidez e elevado teor alcoólico (para um branco) permite-lhe acompanhar pratos de peixe de sabor forte e vincado. A Quinta do Monte d’Oiro produziu um excelente Viognier: Vindima 7 de Outubro 2003. Se conseguir encontrar garrafas à venda —parabéns: merece saboreá-las. Quando comprei as primeiras garrafas sugeriram-me que as usasse para acompanhar um borrego assado. Julguei que se tratava de uma brincadeira. Não era.
Prato 5: Pato com risotto dos seus “miúdos” e salada de rucola e agrião com Parmesão
1. Château le Grand Vostock Cuvée Karsov
Casta dominante: Cabernet Sauvignon
Produtor: Château Le Grand Vostock (Rússia)
2. El Nido Clio 2003
Castas dominantes: Monastrell (70%), Cabernet Sauvignon (30%)
Produtor: Bodegas El Nido (Espanha)
3. 2001 Zinfandel - Sonoma County, Monte Rosso Vineyard
Casta dominante: Zinfandel
Produtor: Rocking Horse Vineyards (EUA)
No caso deste prato, a escolha óbvia é um Cabernet Sauvignon, mas um Zinfandel ou até um Pinot Noir são perfeitamente razoáveis. Todos têm características adequadas ao acompanhamento de um prato de pato. Acabei por excluir os Pinot Noir de consideração e fazer três recomendações.
A primeira escolha é talvez a mais inesperada: um Cabernet russo. Na Rússia é costume dizer-se que o melhor vinho nacional é o vodka. Os vinhos a preços mais modestos eram importados da Moldova e da Geórgia — até às sanções económicas decretadas por Putin. Para lá disso, só vinhos ocidentais. A ideia de um vinho russo de elevada qualidade parecia um projecto irrealizável. Até que em 2003 Nikolai Pinchuk, director do Château Le Grand Vostock, decidiu tentar. Com tecnologia francesa, apoio de consultoria do Château Mouton Rothschild e sob a direcção do enólogo Frank Duseigneur, em poucos meses criaram-se as condições para a produção de vinhos de alta qualidade. Devia ser um case study obrigatório, em países como Portugal.
Num jantar em Moscovo experimentei este Château le Grand Vostock Cuvée Karsov. Acompanhou uma entrada de língua de vaca em gelatina de cogumelos com molho amargo de rábanos e um prato principal de costeletas de vitela, com molho de uva e tangerina. É um vinho estruturado, onde se nota bem a madeira. A probabilidade de o encontrar no mercado nacional é próxima do zero, mas como gostaria de o voltar a provar, recomendo-o.
Em alternativa, sugiro um vinho recente e notável: o El Nido Clio 2003. É produzido na zona de Jumilla, no interior do triangulo definido por Murcia, Albacete e Alicante. O Monastrell, uma casta antiga que a filoxera quase exterminou, dá-lhe uma cor mais escura do que o matiz normal dos Cabernets. É um vinho intenso e carregado de taninos. Em comum com o Cuvée Karsov tem um travo picante, apimentado, e um final prolongado. Se não estiver disponível por cá, deve ser fácil de encomendar (das garrafas que trouxe de Bilbau, já só tenho uma).
A vinha de Monte Rosso é uma vinha “histórica” de Sonoma County, CA: data do séc. XIX e tem condições geográficas e climatéricas excepcionais. Adicionalmente, as vinhas de Zinfandel tendem a ser antigas (a casta é muito resistente). Estes dois factos explicam a elevada quantidade e qualidade de vinhos desta casta originários de Sonoma County.
O Zinfandel produzido pela Rocking Horse Vineyards poderá não ser o melhor da região: tenho lido notas de prova extremamente elogiosas a outros vinhos da mesma casta, como por exemplo o Zinfandel produzido em Sonoma County pela Ravenswood. Mas decidi basear as minhas recomendações no que bebi, não no que li. É um vinho carregado de fruta, estruturado (tem 16°), com sabor a noz moscada e um final longo. Espero que o pato não se deixe intimidar.
Por fim, uma recomendação geral: é fundamental escolher os copos apropriados às características dos vinhos. A linha Vinum extreme da Riedel é capaz de satisfazer todas as necessidades. A aquisição de diferentes tipos de copos de vinho não exige uma despesa tão elevada como possa parecer à primeira vista: há sempre castas que são consumidas com maior frequência relativa e o mesmo formato de copo, por regra, adequa-se a diversas castas. Só é preciso saber escolher.
Fernando Cruz Grabriel
No comments:
Post a Comment